Nas atividades cotidianas, simples ou complexas, podemos perceber que nossa vida é repleta de crenças silenciosas e da aceitação tácita de evidências que raramente questionamos, pois nos parecem naturais e óbvias.
A atitude filosófica surge quando nos deparamos com o conceito reflexivo e crítico. Inicialmente, essa atitude é negativa, pois se opõe ao senso comum, questionando as ideias e experiências cotidianas que são tidas como estabelecidas.
Para alcançar o senso crítico, é preciso abandonar os pré-conceitos que temos sobre a realidade e as evidências do cotidiano.
A filosofia visa proporcionar um conhecimento que vai além de nossa realidade imediata, questionando aquilo que consideramos natural e óbvio.
Em geral, a filosofia é frequentemente questionada. Diferente de outras áreas do conhecimento, a pergunta "para que serve a filosofia?" é, muitas vezes, feita de forma sarcástica, desafiando sua utilidade e participação na sociedade. Enquanto outras disciplinas buscam valor e utilidade prática, a filosofia se preocupa com a racionalidade e com a natureza do "porquê".
A sociedade define o que é útil e o que é inútil com base em seus próprios interesses e bem-estar. Dessa forma, a filosofia muitas vezes é vista como algo fútil, pois desafia os resultados visíveis das ações e das coisas.
Para Platão, no entanto, a filosofia é um saber verdadeiro, que deve ser utilizado em benefício dos seres humanos. É necessário compreender as coisas em suas qualidades essenciais, e, assim, a filosofia se torna o saber mais útil que os seres humanos podem adquirir.
Filosofia e Curiosidade: A Perspectiva de Marilena Chauí
Segundo Marilena Chauí, a filosofia é o questionamento contínuo sobre o mundo e a realidade que nos cerca — questionamentos que, quando crianças, fazíamos com total espontaneidade. Na infância, não nos preocupávamos com o fato de nossas perguntas serem incontestáveis ou inquestionáveis; a curiosidade nos movia. Com o tempo, porém, as respostas que recebemos ao longo da vida nos trazem conforto, e, muitas vezes, deixamos de questionar.
Como adultos, muitas vezes limitamos nossas dúvidas por medo e deixamos de levantar questionamentos. Isso faz com que construamos respostas e conclusões para perguntas que nem sequer formulamos. Tornamo-nos prisioneiros de um "sistema entrelaçado" de respostas metafísicas sobre o eu, o conhecimento, a realidade, os valores e o sentido da vida. Criamos nossas versões da realidade, e, pior, acreditamos que elas são a verdade a ser seguida.
O problema é que interpretamos nossas experiências de maneira limitada e rígida. Explorar novas concepções e perspectivas nos permite ampliar nossos horizontes e substituir velhas respostas por novas. A filosofia, enquanto atividade, nos estimula a fazer isso, permitindo-nos explorar novas visões de mundo, tanto metafísicas quanto físicas.
Epicuro e a Filosofia como Atividade
Na busca por uma definição do que seja filosofia, André Comte-Sponville destaca a importância de Epicuro em sua trajetória acadêmica. Epicuro acreditava que a filosofia não era apenas um sistema de ideias ou uma contemplação passiva, mas uma atividade. "Pensando melhor, vive-se melhor", dizia ele, ressaltando que a filosofia visa a felicidade através da sabedoria. Para Epicuro, a felicidade não é uma busca por prazeres efêmeros ou ilusões, mas uma relação com a verdade.
A sabedoria, nesse sentido, é a felicidade em sua forma mais pura, ou a "alegria que nasce da verdade". A felicidade do sábio não está em recompensas externas, mas na virtude em si, na capacidade de viver em harmonia com a verdade. Embora a felicidade possa ser procurada através de ilusões ou diversões, a verdadeira felicidade, segundo Epicuro, é a que surge da sabedoria e da verdade.
A Filosofia e o Compromisso com a Verdade
Embora a filosofia tenha como meta a felicidade, ela não se reduz a isso. A felicidade não é a norma da filosofia, mas uma consequência de uma vida comprometida com a verdade. Não é porque uma ideia nos faz felizes que devemos aceitá-la; muitas vezes, verdades desconfortáveis são mais valiosas do que ilusões confortáveis. Assim, a filosofia busca não apenas a felicidade, mas a lealdade à verdade, através de investigações rigorosas e críticas.
A Filosofia como Ofício: O Processo de Aprender e Ensinar
De acordo com Barnes, ser pesquisador é um ofício, assim como ser aluno. Para que isso aconteça, o pesquisador precisa desenvolver e aprimorar habilidades fundamentais, como o ato de estudar, ler e escrever. O processo de aprendizagem envolve saber fazer, entender que o que é aprendido também pode ser ensinado, e compreender que, ao aprender, se aprende a ser cidadão, socialmente engajado e trabalhador.
Para ser um bom filósofo, é necessário, portanto, desenvolver certos hábitos intelectuais. O ato de estudar exige preparação, organização do tempo e do ambiente, e uma gestão eficiente dos recursos. As estratégias de estudo envolvem pesquisa, questionamento, leitura e revisão. No ato de ler, a compreensão do texto vai além da leitura superficial, exigindo uma análise crítica e o esclarecimento das ideias do autor.
Conclusão: O Bom Filósofo e a Humildade Intelectual
Concluímos que, para ser um bom filósofo, é preciso deixar de lado o senso comum, mas sem ignorá-lo completamente. O filósofo compreende a realidade das pessoas que ainda se apegam ao senso comum, respeitando essas perspectivas, mas buscando uma verdade mais profunda. A filosofia abrange diversas áreas do conhecimento, prezando pela verdade, pela felicidade individual e pela felicidade universal.
O bom filósofo busca, com humildade intelectual, investigar e questionar de forma leal, nunca se deixando levar por respostas fáceis ou convenientes. Ele entende que a filosofia é uma busca contínua pela verdade, que deve ser cultivada com paciência, rigor e respeito.
BARBOSA, Thaísa. A filosofia como caminho para a reflexão crítica e o conhecimento verdadeiro. Fragmentos de um silêncio inquieto, 03 dez. 2024.
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