Pular para o conteúdo principal

Criativo nulo

  

    É impressionante a perturbação que sinto quando não escrevo, como se houvesse uma ausência profunda ao não poder expor os turbilhões dentro de mim. No entanto, quando me disponho a escrever, a criatividade desaparece. É como se as palavras me faltassem, como se meus dedos se tornassem pesados e eu perdesse toda a energia necessária para seguir em frente.

    Lembro-me de algo que escrevi quando minha família e eu enfrentávamos uma crise devido à saúde do meu pai, que já não está mais conosco. Quando revivo aqueles momentos, a memória vem em forma de céu cinza, como se, naquele ano, o verão jamais tivesse existido. Tudo era nublado, sombrio, e, em alguns momentos, chuvoso.

    Agora, sinto que esse mesmo sentimento se apresenta novamente. É como se o sentido de viver e de pertencer fosse tão abstrato que me sinto incapaz de traduzi-lo ou interpretá-lo.

    As dúvidas sobre o ser, sobre a existência e o sentido de simplesmente ter ar nos pulmões são perturbadoras. Até o ato de respirar me parece um desafio, como se fosse difícil encontrar propósito no simples fato de viver. Talvez seja essa fúria avassaladora chamada tempo que me perturba, arrancando de mim o desejo de me sincronizar com o incessante tic-tac do relógio.

    A cada segundo que tento acompanhar, sinto uma partida frustrada. Não tenho forças para observar os ponteiros do relógio que não param, que não se cansam, pois sempre há outro a substituir o anterior, como se o tempo fosse imortal e eu, no entanto, irrelevante.

    O trabalho, os relatórios e o peso da hierarquia, tudo isso parece se acumular, criando uma pressão constante. E a culpa por não conseguir ser melhor, por não conseguir cumprir com o horário, é esmagadora.
Por que é tão difícil? Às vezes, parece que 5 ou 10 minutos a mais de descanso ou adiamento acabam sendo mais satisfatórios do que simplesmente chegar no horário, como se aquele pequeno atraso fosse uma válvula de escape, um alívio momentâneo da pressão que sinto.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A pressão da escolha acadêmica e profissional na sociedade contemporânea: reflexões sobre o sucesso, o empreendedorismo e o ensino tradicional

     Nos últimos anos, a pressão para escolher uma formação acadêmica e uma carreira tem aumentado significativamente, especialmente com a ascensão de novos discursos sobre sucesso e profissão. A proliferação de coaches e influenciadores digitais, que associam a ideia de realização pessoal e profissional ao empreendedorismo, adiciona uma camada extra de ansiedade, principalmente para os jovens que tentam decifrar o que esperam do futuro. Em meio a essas pressões, é interessante recorrer a pensadores que, de diferentes maneiras, ajudaram a entender o que está em jogo nessa escolha e como a sociedade enxerga o sucesso.      Por um lado, a valorização do empreendedorismo, amplificada pelos coaches, se conecta com o que o filósofo Zygmunt Bauman chamou de modernidade líquida. Bauman argumenta que, na sociedade contemporânea, as relações, os empregos e até as certezas existenciais se tornam volúveis e passageiras, como "líquidas". Nesse contexto, a ênfase no emp...

Meus 24 anos

Hoje, ao completar 24 anos, percebo que o tempo se desdobra diante de mim como uma metáfora viva. Ele se estica, se comprime, como as ideias que cruzam minha mente — inconstantes, inquietas, e por vezes contraditórias. Sou, de algum modo, um reflexo da filosofia que estudo, das dúvidas que cultivo e das certezas que ainda não encontrei. Aos 24 anos, me vejo como um território vasto e inexplorado, onde cada dia representa uma nova estrada a ser percorrida, com suas bifurcações e curvas inesperadas. A filosofia tem sido uma lente através da qual busco entender a complexidade do ser. Ela me fornece as ferramentas para olhar para dentro, para questionar tudo — até o que parece inquestionável. E embora, muitas vezes, isso seja desconfortável, é nesse desconforto que encontro transformação. Sou grata por cada pensamento que me move, por cada dúvida que me assombra, por cada dúvida que, de alguma forma, me revela. Como sagitariana, sou naturalmente movida pela busca incessante por respostas ...

Uma Reflexão Filosófica: A Hipocrisia do Natal

Uma Reflexão Filosófica: A Hipocrisia do Natal: A hipocrisia do Natal, quando vista sob uma ótica filosófica, pode ser interpretada como uma contradição intrínseca entre o que é proclamado e o que é praticado, entre o ideal e o real. O Natal, em seu sentido mais profundo, carrega uma mensagem de amor incondicional, fraternidade e reflexão sobre a condição humana. É um convite à generosidade e à solidariedade, à pausa para uma avaliação moral do que somos e do que podemos nos tornar. No entanto, essa mensagem se dilui na efervescência de um sistema que prioriza o consumo, a aparência e a busca por status. Na filosofia existencialista, por exemplo, esse desencontro entre discurso e ação reflete a angústia humana diante de uma sociedade que impõe significados muitas vezes distantes das necessidades e dos anseios genuínos da alma. Jean-Paul Sartre poderia argumentar que, ao viver de forma tão alienada, ao adotar um comportamento superficial e vazio em nome de convenções sociais (como as d...